quinta-feira, 12 de novembro de 2020

aqui do outro lado #04: chegando aqui do outro lado

tudo começou com um “sim”. não esse que você está pensando. bem, não ainda. mas, em ambos, o coração tava batendo forte, apesar dos motivos serem bem diferentes. o sim em questão, foi envolto de nervosismo e apreensão. “por quê?”, sua curiosidade indaga. antes do sim, antes da pergunta que me fez dar essa resposta, veio a expressão “preciso conversar contigo”. o frio na barriga misturado ao nervosismo e a apreensão deve ter durado segundos, já que ouvir a pergunta “estou pensando em procurar trabalho no japão, se eu conseguir tu vem comigo?” e o “sim” que veio segundos depois, foi a parte mais tranquila de toda a situação. desse momento até a certeza de se mudar para o outro lado do mundo foi de alguns meses. nesse meio tempo, previsões foram sendo feitas, outros sins foram ditos, inclusive aquele que você imaginou lá no começo.

nunca imaginei que minha primeira viagem internacional seria para me mudar. Não foi uma mudança propriamente dita, porque ainda teria que retornar ao brasil por uns meses devido a toda uma burocracia de visto para casais de mesmo sexo e coisa e tal; mas foi uma viagem com o objetivo de procurar uma casa e ter o gosto de como seria morar fora. como nesse primeiro momento minha volta seria rápida, não houve o impacto da mudança definitiva. mas pequenas coisas foram sendo construídas para, depois de 5 meses (cinco longos meses longe do marido), a ficha realmente caísse.

quem conhece sabe que recife é uma cidade quente. até então, eu só havia sentido um pouco de frio quando saí da quentura recifense e peguei 17° no rio. Pois bem. A primeira mudança foi chegar no pico do inverno japonês, com temperatura variando entre 4-8ºC. sem casaco. pois, é. sem. casaco. bem, eu estava com um casaco de capuz da riachuelo, com mais duas camadas de roupas, cachecol, gorro, luvas, e com frio. a ideia era chegar no aeroporto no japão e comprar um casaco próprio para o frio daqui. mas vocês já viram o tamanho do japonês médio? já viram meu tamanho? para quem não me conhece pessoalmente, pode acreditar em mim que sou grande. mas com muita busca, muito frio, conseguimos achar lojas com roupas maiores. o curioso é que esse é um dos desafios e também uma das facilidades daqui. ao mesmo tempo que eu fico restrito a poucas lojas com roupas maiores, está sendo mais fácil achar determinadas roupas aqui que no brasil. vai entender…

foi inegável o quão deslumbrado eu estava com tudo. tudo era diferente. todo canto que eu olhava, não conseguia ler nada (hoje já tá mais fácil ler. ler. já entender…), a quantidade de pessoas é surreal (mas eu conseguia enxergar tudo por cima das inúmeras cabeças. eu falei que o japonês médio é baixo…), os sons, o clima, o cheiro… O CHEIRO. o inverno têm cheiro! Não lembro se me dei conta disso quando cheguei, mas no final do verão do ano passado (2019), deu um estalo na minha cabeça que eu tava sentindo falta do cheiro do inverno. (nota pessoal: prestar atenção no cheiro do outono, já que é o único que não estou lembrando. e não fazer piada com o cheiro da primavera). eu não tinha essa percepção no brasil, a não ser o cheiro da chuva quando caía na terra, na grama…

mas a todo instante voltava o pensamento: você não está turistando, é aqui que você vai morar. apesar da mudança já estar “decidida” (coloco entre aspas porque toda decisão pode ser mudada), eu precisava estar confortável com viver aqui. com tanta coisa nova e tudo se mostrando adaptável, aquele medinho de “não vou conseguir”, foi se transformando para “quero vir logo de vez”.

e a ficha vai caindo aos poucos... mas ela cai por etapas. principalmente com as despedidas. ou melhor, com os abraços. abraço e choro sendo segurado para passar quatro meses longe do marido e organizar as coisas no brasil. e depois, mais abraços e. bem, se eu for pra esses abraços acho que estaria pulando muita coisa.

eu “ri” de mim mesmo ao chegar no brasil, porque a pessoa aqui se desacostuma fácil. assim que desci no aeroporto de são paulo, sentir o calor e não conseguir andar direito porque todos mundo tava andando pra todo lado e eu reclamando comigo mesmo. no japão tem um lado “certo” de ir e vir. normalmente você anda do lado esquerdo e quem vem, é pela direita. E quando não é assim, geralmente tem alguma sinalização. então, apesar de ter muuuuuuuuuuuuuuuita gente em grandes centros aqui, o movimento das pessoas é mais fluido. e sobre o calor, SP já tava quente, recife tava ainda mais. bem, recife só ganha porque faz calor o ano todo, mas o verão daqui do japão ganha de lavada. com sensação térmica passando dos 40°, umidade do ar beirando os 100%, a sorte é que é por apenas três meses.

esses meses no Brasil teve gosto “últimas vezes” e “até logo”. entre as burocracias para resolver meu visto, tiveram os encerramentos com os clientes, as chamadas de vídeo com o marido (pra mim, de manhã, pra ele, a noite), e vários e vários encontros com os amigos. e a ficha caindo com os inúmeros abraços. abraços de "até você voltar ou eu ir pra lá" me foram fazendo perceber que eu estava indo. abraços cheios de histórias sendo concluídas, encerrando capítulos, deixados inacabados, se iniciando, dando continuidade… abraços.

eu estava saindo de casa para ir pra casa.

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